"elas subiam em direção à basílica de notre-dame... não estavam indo rezar, afinal não entrariam nesse templo sagrado do cristianismo... eram muçulmanas... seu deus era Alá e seu profeta Maomé... como tradicionais fiéis islâmicas, iam vestidas com a burca... era o último dia que lhes era permitido usar tal vestimenta em público em solo francês... e era justamente por isso que caminhavam rumo à igreja, pois era lá ao seu redor que estava o ponto mais alto da cidade... era sua última possibilidade de dar um passeio e contemplar aquela bela paisagem vestidas daquela forma... no dia seguinte, já não poderiam mais fazer isso... caso contrário, seriam multadas pelo governo... mas elas se recusavam a abandonar essa roupa... se assim o fizessem, iriam se sentir completamente envergonhadas e indignas por causa desse desnudamento... restava-lhes, portanto, ficar dentro de suas casas... como prisioneiras de si mesmas... mas já estavam acostumadas a isso, de certa forma... desde que nasceram, não tinham nem voz nem rosto... essa submissão já estava colada em seus corpos... não era possível mudar isso de um dia para o outro, da água para o vinho... nem como quem troca de roupa... afinal, elas não mudavam nunca o tipo de roupa... talvez suas filhas e netas, por nascerem em um país com uma cultura distinta, passassem a adotar outros hábitos e, assim, ter mais voz, mais liberdade... seria uma mudança geracional... para elas, isso já não era mais possível... as leis do governo francês não se sobreporiam às leis do Alcorão... por isso, aproveitavam esse belo dia de sol para caminhar e apreciar a linda vista da cidade... pela última vez..." *
Tiago Elídio...
"Vendo vocês duas aí, olhando a cidade que não é sua nem de seus filhos, mesmo que eles tenham nascido aqui. Esse véu que cobre vocês, vítimas inocentes, é que separa a pertença. A negação de viver onde se está e a reciprocidade da cidade. Ela nega a vocês o seu melhor pedaço. Viver fora desse mundo em que vocês entraram e procriar nesse espaço é seu erro e sua força de combate. Seus filhos odeiam e são rejeitados. Eles são uma parte ativa desse exército de pseudo-franceses. Infelizmente também vivo nessa negação. Nego que não vejo mal algum em vocês. Sou silencioso, como um gato, e termino em um silvo, desapercebido. Agora que eu tenho vocês na minha mira posso começar o meu trabalho. Inshalá."
Fernanda Vilar...
Foto: Tiago Elídio / Lyon, França...
*versión en español abajo en los comentarios...
2 comentários:
"ellas subían en dirección a la basílica de notre-dame... no estaban yendo a rezar, a fin de cuentas no entrarían en ese templo sagrado del cristianismo... eran musulmanas... su diós era Alá y su profeta Mahoma... como tradicionales fieles islámicas, iban vestidas con la burqa... era el último día que les era permitido usar tal vestimenta en público en suelo francés... y era justamente por eso que caminaban rumbo a la iglesia, pues era allá al su alrededor que estaba el punto más alto de la ciudad... era su última posibilidad de dar un paseo y contemplar aquel bello paisaje vestidas de aquella forma... el día siguiente, ya no podrían más hacerlo... caso contrario, serian multadas por el gobierno... pero ellas se recusaban a abandonar esa ropa... si así lo hicieran, irían sentirse completamente avergonzadas e indignas por causa de ese desnudamiento... les restaba, por lo tanto, quedarse dentro de sus casas... como prisioneras de si mismas... pero ya estaban acostumbradas a eso, de cierta forma... desde que nacieron, no tenían ni voz ni rostro... esa sumisión ya estaba pegada en sus cuerpos... no era posible cambiar eso de un día para el otro, del agua para el vino... ni como quien cambia de ropa... a fin de cuentas, ellas no cambiaban nunca el tipo de ropa... talvez sus hijas y netas, por nacer en un país con una cultura distinta, pasasen a adoptar otros hábitos y, así, tener más voz, más libertad... sería una cambio generacional... para ellas, eso ya no era más posible... las leyes del gobierno francés no se sobrepondrían a las leyes del Alcorán... por eso, disfrutaban ese bello día de sol para caminar y apreciar la linda vista de la ciudad... por la última vez..."
mais do que um "todo-econômico" o empreendedorismo intelectual e social do ocidente acaba por desrespeitar as únicas histórias que um povo, longe do "pneumático" conceito de nação, tem a contar e a sentir...
sem adentrar nas questões de liberdade e direitos humanos... estamos falando de sentimentos e de alteridade.
Lindo texto, Tiago!!
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